15 de janeiro de 2012

Emilinha Borba entrevista Bela Rudenco

Como vivia uma cantora popular na extinta URSS?

A resposta está abaixo, extraída do livro DIÁLOGO BRASIL-URSS, escrito por Nestor de Holanda, meu pai, após sua viagem à União Soviética, em 1959. Foi publicado pela Editora Civilização Brasileira, com a 1ª edição em 1960. A seguir, transcrevo a nota do autor para a 2ª edição de 1962:

"Reuni perguntas de cem brasileiros, reconhecidamente anticomunistas ou indiferentes. E, na União Soviética, onde visitei oito das quinze repúblicas, e algumas dezenas de cidades, entrevistando gente nas ruas, nos bondes, lojas, escritórios, em toda a parte, obtive as respostas de pessoas cujas profissões correspondem às dos perguntadores.

Assim, eis um livro insuspeito, sobretudo elaborado com absoluta imparcialidade. Não é contra nem a favor do comunismo; é, apenas, esclarecedor. A bem da verdade, devo dizer, entretanto, que não sofri qualquer restrição, na URSS, ao elaborá-lo. Pelo contrário, recebi colaborações e aplausos. E tanto as perguntas como as respostas foram autenticadas pelos respectivos autores, estando comigo, à disposição de qualquer interessado, todos os originais.

É difícil cotejar o nível de vida do Brasil com o da União Soviética. São tão diferentes que não temos como fazer comparações. Além disso, lá, as taxas de câmbio variam conforme a natureza da operação. No comércio internacional, com um dólar se obtêm quatro rublos; no câmbio turístico, um dólar vale dez rublos. Por aí, talvez o leitor possa calcular alguns valores, mas não conseguirá aquilatar o padrão de vida no país, e, muito menos, confrontá-lo com o nosso.

Finalmente, aí está, em nova edição, este livro, que, propriamente, não é meu, pois fui, tão-só, portador de perguntas e respostas, mas cujo êxito é motivo de grande orgulho para a minha tarefa jornalística.

Nestor de Holanda"

20 (1)

Emilinha Borba
"Perguntas de EMILINHA BORBA, cantora popular.
Respostas de BELA RUDENCO, do Teatro de Kiev (2).

Um êxito musical é compensador monetariamente?

– Sim. Eu, por exemplo, ganho 200 rublos por minuto, durante as gravações. Há, porém, artistas mais famosos e mais antigos, com títulos honoríficos etc., que percebem 500 rublos por minuto. A vantagem desse sistema é que a música, obtendo êxito ou não, rende sempre bem para o intérprete. Se deixamos de receber mais, pelo fato de uma gravação ser muito vendida, não recebemos menos, em compensação, quando um disco tem pouca aceitação no mercado.

Qual o salário de uma cantora popular?

– Aqui, devo dizer, antes de lhe responder, que não temos essa distinção. As cantoras de músicas clássicas, que fizeram cursos nos conservatórios, também interpretam músicas populares, tanto em discos como no rádio, na televisão, teatros, cinema etc. O salário mínimo de uma cantora, em qualquer lugar, é de 1 500 rublos. O máximo, de 7.000. E cobramos as nossas atuações em espetáculos para os quais somos convidados.

Vocês cantam versões?

Bela Rudenco
Sim. Muito e de todos os países a nosso alcance. A música desconhece fronteiras. Ela é como nosso amor por toda a Humanidade.

Há limites para as importações de músicas?

– Claro que não. Logicamente, cada cantor dá preferência às melodias de seu país, mas interpreta à vontade, composições de todo o mundo, sem que sofra, por isso, qualquer injunção oficial.

Você tem fãs-clubes? (3)

– Não. Aqui não há esse hábito, muito engraçado, por sinal. Os fãs nos aplaudem, enviam flores, pedi- in fotografias e autógrafos, e, às vezes, depois dos espetáculos, nos acompanham até em casa, pela rua, em grupos, batendo palmas.

Você gostaria de vir ao Brasil?

– Meu sorriso para o repórter é demonstração inequívoca de que sim. Gostaria imensamente."

(Ouçam gravações das duas cantoras populares, em seus países, nos links abaixo)

Notas do autor e do editor:
(1) Número de ordem do entrevistador no livro (N.E.). 
(2) Bela Rudenco é das mais populares cantoras da Ucrânia (a república de onde têm saído os melhores cantores da URSS) e vem ganhando fama, a cada dia, em todo o país. É profissional há, apenas, 5 anos. Já atuou, com êxito, em temporadas sucessivas, em várias repúblicas da União Soviética e na França, Polônia, Alemanha, Rumânia etc. Foi laureada cm dois concursos internacionais de canto: em Paris, onde venceu nada menos que 120 cantores de diferentes países, e em Moscou, por ocasião do VI Festival Mundial da Juventude, do qual participaram concorrentes de 58 nações. Bela é casada com o tenor Roberto Cochanóvisque, ao qual conheceu quando ambos ainda eram estudantes, no conservatório.
(3) A cantora soviética não sabia o que era fã-clube. O repórter explicou. Ela achou muita graça na coisa, interessando-se mesmo pelo processo usado pelos admiradores dos artistas brasileiros, tendo declarado, ao final, que os fãs-clubes eram curiosos, mas não ficava bem enaltecerem tanto um cantor popular, sem curso, quando o artista clássico sempre merece muito mais, uma vez que, no Brasil, há distinção entre as duas categorias de cantores.

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